Borboletear no mistério da aprendizagem

"No mistério do sem-fim

equilibra-se um planeta.

E, no planeta, um jardim,

e, no jardim, um canteiro;

no canteiro uma violeta,

e, sobre ela, o dia inteiro,

entre o planeta e o sem-fim,

a asa de uma borboleta"

Este poema singelo de Cecília Meireles sempre me intrigou; seus símbolos fortes e concêntricos : sem-fim, planeta, jardim, canteiro, violeta .

Sentimos a respiração que contrai até a pétala de uma flor e se expande ao infinito. Um equilíbrio sutil e delicado garantido por um vôo quase diáfano da asa de uma borboleta.

Em um outro poema, a Elegia a uma pequena borboleta , a poetisa descreve quão delicada é esta relação: "miraculosa, alva, divina, criatura de pólen, de aragem, diáfana pétala da vida! ". Explica no poema a nossa dificuldade de lidar com esta trama sutil pulsante: "humana insuficiência:— a confusão dos nossos olhos— o selvagem peso do gesto,— cegueira — ignorância — remotos instintos súbitos — violências que o sonho e a graça prostram mortos".

Penso que hoje encontrei uma das possíveis chaves desta matriz de intelecções que é o texto poético ao relacionar tamanha sutileza e preciosidade com o ato de ensinar. Borboleteamos o universo à procura do mistério do vínculo, esta presença pulsante, esta luz nos olhos de quem se abre para um novo encontro de saberes e afazeres.

Manter esta constância na maré de distrações que é o mundo moderno, navegando de respiração em respiração, num pulso candente de doçura nos gestos e silêncios respeitosos aos espantos, não é fácil. A atenção não pode ser rígida ao ponto de só sobrar o casulo da ausência e o movimento da descoberta de flor em flor nos convida: seguir asa à asa, um fluxo de investigação que pode nos levar à um sem fim de possíveis.

Lembro aqui das reflexões da Bia Padial sobre a propriocepção , esta escuta sensível dos corpos que falam :

"Que tal começarmos ouvindo e sentindo o que cada um desses adolescentes têm a nos dizer nos seus silêncios dormentes? Que tal abrirmos outros sentidos para (re)conhecê-los? Observar mesmo? Silenciar um pouco para que se apresentem nos seus (não)movimentos atuais?"

São gestos mínimos, entre palavras, suspiros, modos de sentar, de olhar e nesta (ad)miração amorosa encontramos harmonias intelectivas em prosas muito além das palavras.

E você já se sentiu assim ? Quais são os sentidos que dão chão aos seus gestos na poética do ensinar ?

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