Pé no chão
Quantas vezes o seu pé tocou a terra ou a areia neste ano ?
Foi com esta pergunta que abrimos o nosso ciclo de leitura do livro: Estar Vivo de Tim Ingold.
Nossos pés foram transformados em simples máquinas de andar dentro de sapatos, perdemos a cultura do chão e as possibilidades de contato e de realizações cognitivas através deles.
Você já pensou em pintar, ou tocar um instrumento com seus pés ?
Vemos isto como extraordinário e mesmo o amassar uvas com os pés, quer era a tradição na produção do vinho é visto atualmente, como pouco higiênico.
Imagine então fazer pão, como é feito ainda hoje , em algumas regiões na India.
O pesquisador britânico explica que esta ascensão da cabeça sobre os calcanhares nos tirou esta proximidade com o chão e modificou completamente nossa ergonomia, separando pés e mãos.
“Na maioria das sociedades não ocidentais a posição habitual de repouso a ser adotada, quando se está acordado é agachado. “pode-se distinguir a humanidade agachada da humanidade sentada”….
Parece que a cadeira bloqueou o desenvolvimento da capacidade normal do ser humano se agachar, assim como a bota bloqueou as funcões preênseis do pé. …
….nas sociedades ocidentais , onde a postura ereta ou “de pé” é uma medida de classificação e retidão moral, a posição de cócoras é reservada àqueles de menor degrau na escala social - a párias , mendigos e suplicantes.
Tim Ingold traz em sua reflexão uma revisão histórica de fatos tão costumeiros , cadeiras e sapatos que nem pensamos questionar e propõe em seu ensaio :
“derrubar o viés da cabeça sobre os calcanhares é dispensar o dualismo subjacente a este argumento. Ao invés de supor que a mão opere sobre a natureza, enquanto os pés se movam nela, prefiro dizer que tanto mão quanto pés, aumentados por ferramentas, luvas e calçado, mediam um compromisso histórico do organismo humano, em sua totalidade com o mundo ao seu redor.
Pois certamente andamos, assim, como falamos, escrevemos e usamos ferramentas com o corpo inteiro. Ademais ao andar, o pé - até mesmo o pé calçado da civilização ocidental - não descreve realmente um ondulação mecânica, como a extremidade de um pêndulo. Portanto, seus movimentos, contínua e fluentemente responsivos a um monitoramento perceptual contínuo do chão à frente, nunca são exatamente os mesmo de um passo seguinte. Rítmicos e não metronômicos o que eles superam não é uma métrica de intervalos constantes, mas um padrão de tempo e espaço.
Te convido portanto a tirar os sapatos e caminhar conosco nesta redescoberta do seu pé no chão em uma realidade que não é lisa , um proposta de retomada da sua consciência muscular e da lucidez de que vivemos em um mundo e não sobre ele.