Vagalumear Residências criativas
“ Voava, porém, a luzinha verde, vindo mesmo da mata, o primeiro vagalume.
Sim, o vagalume, sim, era lindo! - tão pequenino, no ar, um instante só, alto,
distante, indo-se. Era, outra vez em quando, a Alegria.”
(Guimarães Rosa: 1962)
Os vagalumes não estão extintos, eles estão por aí, somos nós que enfeitiçados pela total claridade, perdemos a capacidade de percebê-los.
O mistério do vagalume está na nossa disposição poética, abertura de possíveis, lampejos de um saber delicado e poético que no tremular da chama nos faz devanear. No livro Em louvor da sombra de Junichiro Tanizaki anuncia :
“a beleza não existe na própria matéria, ela é apenas um jogo de sombras e de claro-escuro surgido entre matérias”.
Este tremular evanescente era para os povos astecas a representação do saber, eles acreditavam que a luz dos vagalumes sinalizava instantes de perspicácia e de conhecimento, uma ação combativa onde antes havia a escuridão.
Na obra de Pasolini, os vaga-lumes aparecem como personagens “‘erráticos, intocáveis e resistentes em momentos de alegria e furor” .
Os vaga-lumes não desapareceram, apenas migraram para outras partes, fugindo dos holofotes que os confundem:
“Alguns estão bem perto de nós, eles nos roçam na escuridão; outros partiram para além do horizonte, tentando reformar em outro lugar sua comunidade, sua minoria, seu desejo partilhado”, diz Didi-Huberman em seu livro : A Sobrevivência dos Vagalumes
No livro de Didi-Huberman existe um convite para que no silêncio, em volta de uma fogueira que explode em vagalumes incandescentes ,voltemos ao estado de poesia, este lusco-fusco que permite conversas sinceras, devaneios e processos de criação.
«A casa é uma das maiores forças de integração para os pensamentos, as lembranças e os sonhos do homem. Nessa integração, o princípio de ligação é o devaneio. (...)
Sem ela, o homem seria um ser disperso. Ela mantém o homem através das tempestades do céu e das tempestades da vida.
É corpo e é alma. É o primeiro mundo do ser humano.Antes de ser "jogado no mundo" (...), o homem é colocado no berço da casa.»
Gaston Bachelard
A Residência criativa é esta casa que acolhe sonhos , este lugar de trocas e amizades, de partilha de projetos e processos de criação.
Elucidamos em projetos de co-criação outros caminhos , residências artísticas, pedagógicas e amorosas, como diz a música:
““Pisca-pisca pesca o olho com a luz da sua isca
Quando apaga recomeça como o ar que se respira
Fogo fôlego varia como água que respinga
Uma coisa tão pequena pode transformar a vida”.
Feche os olhos, olhe para o que pulsa em você, respire fundo e verá que somos muitos cintilando outros horizontes/caminhos.
Vem vagalumear !