Biosofia

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Ao longo destes últimos doze anos de trabalho da Residência criativa, desenvolvemos uma metodologia de mentoria dos processos de criação.  Em diversas mentorias realizadas, percebi a importância da memória e a influência desta nos padrões perceptivos da realidade,

Eu não me refiro aqui, simplesmente a esta memória superficial que coleciona momentos os quais, partilhamos em nossos currículos profissionais ou nas mídias sociais. 

O que investigamos são memórias mais profundas que revelam modos de ser e que estão impregnadas seus gestos cotidianos e nas sutilezas da suas formas de sentir.

Nas atividades propostas para o desenho da sua biosofia temos acesso a estas histórias que são os olhos d'água de uma vida e que se apresentam como nascentes de problemas ou fonte de criatividade.

O problema da vida não é sempre um problema clínico. Todos nós temos sofrimentos, experiências em que vivemos um descompasso entre nossa potência e a capacidade de agir frente a uma realidade que de algum modo nos fere.

Os processos criativos são em algumas circunstâncias, uma forma de dialogar com estes impasses e dificuldades que a vida apresenta. 

É quando vamos buscar em nosso interior ou em exemplos externos caminhos que nos proporcione a compreensão e/ou regeneração  destes descompassos vivenciados.

A imaginação é a arte da nossa própria existência mental, nossas imagens imaginadas criam um campo perceptivo.

O que não está neste horizonte de consciência é dificilmente percebido e aqui reside a fundamental importância de ampliar o nosso repertório de experiências, nutrindo nossa imaginação com outras vidas que não a nossa.

As biografias são relatos de aprendizagens que podem nos instigar e apresentar outros modos de enfrentamento de dificuldades que também vivemos.

A literatura se alimentou desta potência educativa e criou os romances de aprendizagem que como as biografias narram o desenvolvimento e a formação de um indivíduo ao longo do tempo.

Em ambos os gêneros, o protagonista enfrenta desafios, amadurece e aprende com suas experiências. Nestes dois modos de narrar, a biografia e o romance, vemos a influência que o contexto social, cultural e histórico desempenha na formação do indivíduo retratado.

A biografia tem um caráter documental e informativo, enquanto o romance de formação, enfatiza a estrutura narrativa e os aspectos simbólicos da jornada do protagonista.

Podemos olhar pra nossa vida mesclando estes dois sentidos, os fatos documentais do que realmente vivemos e as possibilidades não escolhidas mas que podem ser redesenhadas em nosso processo criativo.

O exercício de ficção permite compreender melhor as causas de nossas escolhas e também os limites de horizonte de consciência que tínhamos naquele ponto histórico específico, restrição que agora não temos mais.

Sabemos que a realidade do desenvolvimento humano é caótica e cheia de voltas; vivemos em espirais que desdobram saberes que não cabem nas retilíneas linhas do tempo histórico. 

             Em 1956, Guimarães Rosa escreveu Grande Sertão Veredas onde o narrador Riobaldo, conta sua história de vida.

             Suas idas e vindas trazem esta forma espiralar de se perceber, como explica Leda Maria Martins:

            " Um tempo ontologicamente experimentado como movimentos contíguos e simultâneos de retroação, prospecção e reversibilidades, dilatação, expansão e contenção, contração e descontração, sincronia de instâncias compostas de presente, passado e futuro.”

A biosofia  se alimenta deste tempo que pulsa, pois o que passou ainda é em nós. Quem vive está em permanente refazimento, como conta a história de Guimarães Rosa:

         Como este refazer cria o seu modo de ser ?

Desenhar a sua biosofia criativa  é reconhecer as suas potências anímicas.

É também investigar quais são os seus modos de fazer a curadoria dos acontecimentos, as suas formas de narrar e como você articula suas lembranças.

Uma abertura para visitar suas memórias em novas e frutíferas veredas, vem conhecer mais da nossa proposta !

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